Fernanda Ferreira

Maio Laranja: Autismo e abuso sexual um alerta necessário

Por Fernanda Ferreira da Silva – Psicóloga ABA e Analista do Comportamento


Maio Laranja: Autismo e abuso sexual um alerta necessário

Olá, queridos leitores. Nesta semana, seguimos firmes com o propósito do maio Laranja – mês de conscientização e prevenção ao abuso sexual de crianças e adolescentes. 

Como psicóloga e analista do comportamento com foco em autismo e deficiência intelectual, trago uma reflexão urgente e necessária: o abuso sexual contra pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) ainda é um tema pouco discutido, apesar de alarmantemente frequente.

A dura realidade: dados que precisam ser ouvidos

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), 1 em cada 3 meninas e 1 em cada 5 meninos sofre algum tipo de violência sexual antes dos 18 anos. 

Quando falamos de pessoas com deficiência, esses números são ainda mais graves. Estudos mostram que mulheres com deficiência intelectual e autismo têm até três vezes mais chances de serem vítimas de abuso sexual quando comparadas à população típica feminina (Sullivan & Knutson, 2000; George Washington University, 2023).

Esses dados são reforçados por uma publicação recente da revista Frontiers in Behavioral Neuroscience, que revelou que cerca de 90% das mulheres autistas relataram ter sofrido alguma forma de violência sexual ao longo da vida. Um número alarmante e inaceitável.

Por que pessoas com TEA estão mais vulneráveis?

Pessoas com autismo enfrentam desafios na comunicação, na identificação de intenções alheias e na compreensão de normas sociais. Essas características, embora naturais ao espectro, podem dificultar:

  • A percepção de situações de risco;
  • O reconhecimento de toques inapropriados;
  • A capacidade de relatar o abuso de forma clara.

Na prática clínica, vemos que comportamentos como estereotipias intensificadas, retraimento, agressividade e regressão em habilidades podem ser interpretações equivocadas de traumas vividos, sendo muitas vezes atribuídos unicamente ao diagnóstico de autismo.

Sinais de alerta que merecem atenção:

  • Estereotipias mais intensas ou frequentes
  • Isolamento repentino ou mudanças sociais abruptas
  • Agressividade ou autoagressão sem explicação evidente
  • Regressão em habilidades já adquiridas (como fala, higiene ou alimentação)
  • Essas manifestações devem ser cuidadosamente observadas e nunca subestimadas. 
  • Elas podem representar respostas comportamentais a experiências traumáticas.

Intervenções baseadas na ABA: o que podemos (e devemos) fazer?

Na Análise do Comportamento Aplicada (ABA), trabalhamos com estratégias funcionais e adaptadas, sempre respeitando o desenvolvimento individual. 

Algumas práticas preventivas e terapêuticas incluem:

  • Treinamento de discriminação entre toques apropriados e inapropriados: utilizando recursos visuais e sociais para ensinar sobre limites do corpo.
  • Educação sexual adaptada: com histórias sociais, jogos de papéis e scripts comportamentais que ensinem sobre consentimento e segurança.
  • Uso de comunicação alternativa (como PECS ou dispositivos eletrônicos) para relatar desconfortos ou situações de perigo.
  • Programas de ensino para reconhecer emoções em si e nos outros, usando escalas visuais e reforçadores sociais.
  • Acompanhamento psicológico contínuo, com foco em trauma, autoconhecimento e autonomia.

O papel dos profissionais e cuidadores

É fundamental que cuidadores, professores e profissionais da saúde recebam formação adequada para identificar sinais de abuso em pessoas neuro divergentes. Pequenas mudanças comportamentais podem ser os únicos indicadores possíveis.

Também é essencial que o ambiente terapêutico seja um espaço seguro, onde a pessoa com TEA se sinta acolhida, compreendida e fortalecida para comunicar qualquer forma de desconforto.

Conclusão: precisamos falar sobre isso

Falar sobre abuso sexual é difícil, mas se calar é ainda mais perigoso. No caso das pessoas com autismo e deficiência intelectual, a prevenção começa na informação, no respeito às particularidades e na escuta sensível.

Neste maio Laranja, nosso compromisso deve ir além das campanhas. É preciso promover uma cultura de proteção, educação afetiva e autonomia para todos — inclusive (e especialmente) para aqueles que mais precisam ser ouvidos.

Com carinho: psicóloga Analista do comportamento, Fernanda Silva .

*Publicado na edição 1873 de 24 de maio de 2025 do jornal Democrata



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